Aulas suspensas: é hora de agir na educação, mesmo que de maneira remota

O necessário distanciamento social, em função da pandemia de coronavírus, fez com que se cancelassem as atividades escolares presenciais em praticamente todo o mundo. Nas salas de aula, o contato de estudantes e docentes é próximo, por isso a escola deve ser das últimas instituições a voltar a funcionar e das primeiras a suspender atividades no caso de nova onda da doença. A depender da duração do fechamento, a angústia de pais, estudantes e professores sobre a concretização do ano letivo aumenta no Brasil.

A educação vive um momento de incertezas e muito tem se debatido sobre o que fazer neste momento de emergência. Praticamente todos os estados, por meio dos Conselhos Estaduais de Educação, normatizaram a possibilidade de considerar atividades remotas no cumprimento do calendário escolar, mediante condicionantes como comprovação da realização das atividades, formulação, divulgação e acompanhamento de planejamento específico e registros da participação dos estudantes por meio de relatórios.

O ideal seria repor todas as atividades de maneira presencial, mas o tempo será inimigo. Concentrar tudo para depois pode significar sobrecarga de trabalho pedagógico para docentes e estudantes. Diante da possibilidade de considerar as atividades remotas, é importante elencarmos princípios e critérios para fazê-lo. Os princípios que entendo fundamentais são: 1) flexibilidade, 2) garantia do direito à educação, 3) foco em habilidades mais do que em conteúdos e 4) bom senso no que tange ao volume de atividades propostas. Ao detalhar os princípios na sequência, trato dos critérios.

1) Flexibilidade para redes, escolas e docentes avaliarem com autonomia o real alcance das medidas propostas em relação aos alunos. Isso deve ser orientador para o registro formal.

2) Garantia do direito à educação será avaliada pelo atingimento dos objetivos do planejamento, resguardada a possibilidade de realização das atividades no retorno para alunos que não conseguiram fazê-las. A demanda por reforço pedagógico será significativa, a avaliação diagnóstica será fundamental para ofertá-lo.

3) Focar em habilidades, ou seja, optar por atividades concernentes à experiência remota, que explorem criatividade e protagonismo discente, que tenham registro e feitura mais simples. Esse critério será fundamental para pensar a avaliação do processo.

4) O bom senso para que não confundamos as atividades remotas com as presenciais em termos de volume, densidade e complexidade. Distanciamento social é tempo atípico, crianças e jovens contam com contextos de apoio familiar distintos, as atividades escolares não podem representar estresse adicional.

Feitos esses apontamentos, gostaria de questionar a resistência de setores mais à esquerda do espectro político em relação a realização e registro de atividades remotas no período de afastamento social. Em nome da defesa dos que “não têm acesso”, adotam uma postura reativa que, a meu ver, é de quem não compreendeu a natureza do que estamos vivendo. O Estado, por meio das instituições, tem de tentar acessar os que não têm acesso, mesmo sabendo que não irá conseguir plenamente.

Os efeitos da crise da pandemia já existem e irão aumentar. Nosso desafio é minimizá-los o máximo possível. As desigualdades sociais e educacionais já existiam antes da pandemia e não iremos solucioná-las agora e nem no retorno às aulas. Nesse sentido, devemos ser propositivos e ofertar atividades nos mais diversos meios possíveis, respeitadas as especificidades das etapas e modalidades de ensino.

Os setores que creem que vamos recuperar as aulas depois (ou no ano que vem) e se agarram ao princípio (fundamental, mas ora abstrato) da igualdade de acesso para defender que nada seja ofertado e registrado agora estão cometendo uma injustiça com os mais pobres. Há pesquisas que demonstram que um período longo de inatividade escolar produz atrasos na aprendizagem, em especial para os mais vulneráveis.

Publicado originalmente no site Nexo Jornal