O APAGÃO DO ENSINO PÚBLICO

Maria José Rocha Lima*

Os alunos e pais da rede pública de todo o Brasil experimentam a triste realidade de um ano perdido. Em 2020, o coronavírus escancarou quadro trágico de desigualdade educacional vivenciado pelos brasileiros. Para estes brasileirinhos, será mais um ano perdido em suas trajetórias escolares e nas suas aprendizagens, tão comprometidas na escola brasileira.

O quadro da educação pública já era trágico, e, depois da pandemia, haverá uma inflexão para mais, com aumento nas taxas de insucesso, representadas pelas  reprovação e evasão escolar, além do aumento da distorção idade-série, sem falar que muitos desses meninos que não aprendem e se desgarram das suas turmas escolares tornam-se  vulneráveis e presas  fáceis para gangues e para os agentes do tráfico, um desafio para o novo ministro da área, Milton Ribeiro.

Em 2018, o então ministro Rossieli Soares apresentou no Senado Federal um Panorama da Educação Brasileira, no qual celebrava o aumento de 57 milhões de matrículas na rede pública, mas denunciava a baixíssima qualidade do Ensino Público, apontando entre as causas o alto percentual de docentes com formação inadequada, variando de 30% a 40%. E metade dos professores  de matemática não tinha formação para a área.

O ex–ministro informou que em 2017 mais de 50% das crianças não estavam alfabetizadas no terceiro ano do ensino fundamental e mais de 370 mil foram reprovadas ou abandonaram a escola em 2016. No Norte e Nordeste, esse percentual chegava a 70%. No 6º ano, somente 82,8% foram aprovadas, mais de 570 mil foram reprovadas ou abandonaram a escola em 2016. Na 1ª série do ensino médio, em 2016, 791 mil jovens abandonaram a escola ou foram reprovados, isto representava 25,9%. Sem contar que 2,2 milhões de jovens encontravam – se em situação de defasagem idade-série no ensino médio, segundo fontes do INEP/MEC.

Uma pesquisa sobre “Trabalho Docente em Tempos de Pandemia” foi feita pelo Grupo de Estudos sobre Política Educacional e Trabalho Docente da Universidade Federal de Minas Gerais (Gestrado/UFMG) e Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE). Os dados foram coletados entre 8 e 30 de junho de 2020, com 15.654 docentes da educação infantil, ensino fundamental e educação de jovens e adultos.

No dia 8 de julho deste ano, a jornalista Elida Oliveira, do G1, publicou matéria informando que quase 90% dos professores não tinham experiência com aulas remotas antes da pandemia e 42% destes seguem sem treinamento, aprendendo por conta própria. Para 21%, é difícil ou muito difícil lidar com tecnologias digitais, segundo o levantamento da UFMG e CNTE.

Os resultados mostram a dificuldade dos professores em lidar com a nova realidade, e o esforço pessoal para transmitir a aprendizagem aos estudantes durante a emergência de saúde provocada pelo coronavírus. Em entrevista ao G1, uma professora desabafou: “Somos analfabetos digitais e só percebemos quando precisamos usar a ferramenta”.

Na pesquisa, 82% dos professores estão dando aulas dentro de casa; 82% dos docentes disseram que as horas de trabalho aumentaram; 84% dos professores afirmam que o envolvimento dos alunos diminuiu um pouco ou diminuiu drasticamente durante a pandemia; 80% dos entrevistados afirmam que a principal dificuldade dos estudantes é a falta de acesso à internet e computadores, seguida pela dificuldade das famílias em apoiar os estudantes (74%); a falta de motivação dos alunos (53%) e o desconhecimento dos alunos em usar recursos tecnológicos (38%).

Para os pesquisadores da UFMG e CNTE, o estado emocional dos professores também está sendo colocado à prova: 69% declararam ter medo e insegurança por não saber como será o retorno à normalidade e 50% declaram ter medo em relação ao futuro.

*Maria José Rocha Lima. É mestre e doutoranda em educação.Foi deputada de 1991 a 1999. É presidente da Casa da Educação Anísio Teixeira.

**Publicado originalmente no site Planalto em pauta.

***Esse artigo não reflete necessariamente a opinião da ACEB.