Filha de empregada doméstica com um marceneiro, Olívia Santana (PCdoB), de 51 anos, foi a primeira mulher negra eleita para a Assembleia Legislativa da Bahia (Alba) nas eleições deste domingo. No estado com o maior número de pessoas que se declaram negros ou pardos — 80,2%, segundo dados do Censo de 2010 do IBGE —, nenhuma mulher negra havia se sentado em uma das 63 cadeiras do Palácio Deputado Luís Eduardo Magalhães, sede da Alba.
Com 57 mil votos, Olívia vai assumir uma das vagas após três tentativas frustadas: 2002, 2010 e 2014. A professora, no entanto, tem uma longa carreira política. Entrou na vida pública em 1988 e, desde então, já ocupou os cargos de secretária de Educação e Cultura de Salvador e secretária do Trabalho no governo do estado. Foi também vereadora em Salvador por 10 anos.
— Como diz Paulo Freire: a gente não pode perder a capacidade de espanto. Em um estado como a Bahia deveria ter várias mulheres negras eleitas. Somos a maioria. A Bahia tem mais de sete milhões de mulheres, e na eleição de 2014 só sete mulheres foram eleitas em um universo de 63 deputados — contou.
A eleição de Olívia, no entanto, não reflete a composição da sociedade no legislativo baiano. Na Bahia, 80,2% da população se declara preta ou parda. Dos cerca de 15 milhões de habitantes, 20,9% se autodeclaram pretos, o maior percentual no país, segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
Com base nas estatísticas do DivulgaCand, sistema do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) criado para a divulgação das candidaturas, dos 63 deputados que compõem a Alba na legislatura atual, apenas dois, se declaram negros: Pastor Sargento Isidório (Avante) e Zé Raimundo (PT). As mulheres representam apenas 11% das vagas.
A representatividade negra e feminina na Alba ainda é baixa. Segundo Olívia, isso acontece porque “a população foi historicamente formada para pensar espaços de poder como espaços dos homens”.
— Há quem diga que não goste da luta feminista, que não goste da luta antiracista. Mas são lutas extremamente necessárias, e eu devo a essa lutas a minha conquista. Nos espaços de poder, homens tomam decisões sobre a vida pública. Caberia, portanto, a mulher reinar no lar, embelezar o lar, cuidar do lar. Mas são os movimentos feministas e negros que estão enfrentando esses esteriótipos — disse.
Para mudar esse cenário e ter mais negros e mulheres na Assmbleia, a professora conta ainda que o sistema eleitoral precisa ser revisto “de uma forma democrática para aumentar os espaços de representatividade de mulheres e negros”. Segundo Olívia, a eleição é apenas uma das formas de lutar por igualdade de gênero e cor.
— Eu sou mulher e negra. Eu sei o que o racismo faz. Eu sei a luta que temos que travar para remover cada empecilho. Sou filha de lavadeira, nasci na favela, fui servente e já lavei muito vaso sanitário. Mas eu tenho inteligência, capacidade de também estar com a caneta na mão e a disposição por gritar por justiça e por políticas públicas que possam alterar a vida das pessoas — contou.
Publicada originalmente no site www.extra.globo.com