Maria José Rocha Lima
Na APLB, a divisão do trabalho na direção aconteceu bem de acordo com os perfis dos diretores. O professor Ideval Alves, com muita sensibilidade, tratou da Secretaria de Cultura. Promovia exposições de artes e, nas greves, articulava muitas atividades culturais. Conversando recentemente com a professora Marinalva Nunes ela me lembrou que, na década de 80, nós já ocupávamos escolas com atividades culturais e de lazer, em substituição às aulas, e realizávamos aulas públicas.
As passeatas, da Piedade ao Campo Grande, em Salvador, eram muito participativas e ricas em alegorias. A nossa criatividade no movimento não conhecia limites.
Foi desse tempo a realização de manifestação sob as árvores da Secretaria da Educação, cheia de atividades culturais, com a participação de reconhecidos artistas plásticos baianos, como o querido Deraldo Lima, da Galeria 13 e criador da Galeria dos Novos, uma figura ímpar tanto nas artes quanto na coragem para enfrentar os governantes; e do ator e diretor teatral Carlos Petrovich.
O querido Petrovich, ou apenas Petrô, como era chamado, foi ator-fundador do Teatro Vila Velha e professor da Escola de Teatro da Universidade Federal da Bahia. Nunca esqueci que Carlos Petrovich fez um enorme dragão colorido, semelhante àqueles dragões chineses, no qual entravam os alunos da escola pública e da UBES que participavam do movimento. Ao cuspir os alunos, o dragão discursava raivosamente palavras de fogo!
Também foi espetacular a atividade cultural de greve, na qual os professores baianos foram ao teatro. Naquele tempo, estava no auge a peça Oficina Condensada, na qual a grande atriz do teatro baiano Rita Assemany interpretava a professora universitária Ivone Brandão, uma professora, uma intelectual e muito louca. Era uma peça sobre as aventuras e desventuras da professora Ivone Brandão, personagem representada pela famosa atriz. Inesquecível. Aliás, cheguei atrasada por conta de uma viagem de sustentação da greve no interior e me lembro como se fosse hoje da Professora Ivone Brandão, procurando:
– Cadê Zezé, cadê Zezé, a nossa líder? A professora, durante a aula, passava uma sacolinha cheia de quinquilharias chinesas e outras bugigangas.
Ela, com muito humor, denunciava a miséria das professoras sendo sacoleiras, para complementar os salários:
– Gente, hoje em dia, um professor universitário para sobreviver leva de um lado uma sacola de material didático, cheio de informação, e do outro uma sacolinha cheia de…… Cheia de …. – E pedia para que a classe completasse. Irritada porque os seus alunos da plateia não respondiam, ela gritava cada vez mais alto:
– Cheia de quê?
Cada vez mais nervosa com a lentidão dos alunos para responder, ela gritava:
– Gente, cadê o pessoal da educação?
E aí os alunos, encorajados, respondiam:
– Leva muamba, professora muamba.
– Leva chinesice.
Ela apurou o ouvido: o que que ela leva mesmo?
– Leva roupa para vender
A noite daquela ida ao teatro marcou para sempre os professores baianos, que lotaram o Teatro Vila Velha. Rita Assemany doou o espetáculo para os professores tão carentes de atividades culturais, especialmente naquele nível.
Obrigada, Rita Assemany, Petrovich e Deraldo Lima!
Publicado originalmente no site: https://planaltoempauta.com.br/professor-ideval-alves-uma-lideranca-da-paz-e-do-bem/